Ontem, acordei com a notícia da morte de José Saramago. Mundialmente conhecido escritor português, vencedor de inúmeros prêmios, inclusive o Nobel da Literatura.
Levou um tempo para que eu pudesse entrar em contato com sua obra.Como um bom vinho, Saramago exige um "paladar" leitor apurado e, talvez, uma certa dose de rebeldia para perceber as ousadias que ele fazia com nossa língua portuguesa.
Lembro-me do encontro com o livro "O ensaio sobre a cegueira" há cinco anos atrás e do impacto que me causou seu discurso tão bem construído e sua maravilhosa visão sobre as inúmeras facetas disso que chamamos ser humano. Arrisco dizer que, até hoje, pouquíssimos livros me fizeram sentir tamanha admiração. Não só pelo enredo e pela trama mas, principalmente, pela forma como as palavras foram combinadas para construir sentido. Uma verdadeira obra de arte.
Curisamente, ao saber que Saramago se foi, não houve nenhuma nota de tristeza. Porque penso que só podemos lamentar as vidas que não foram vividas. Aquelas que foram interrompidas sem que a experiência fosse carregada de presença, entrega e intensidade.
José Saramago esteve sempre lúcido. Sempre presente. Sua voz costumava ecoar em meio as injustiças, denunciando, muitas vezes, os tantos "reis nus" que ainda teimam em disseminar suas tiranias.
Sua obra, mais do que qualquer outro legado, atesta sua grandiosa humanidade. Coisa que apenas os homens simples e atentos à experiência da vida são capazes de testemunhar.
Há pouco tempo, li uma entrevista com o autor dizendo que "não poderia ter morrido sem ter conhecido Pilar." Lembro-me o quanto essa tenra declaração de amor à sua esposa tocou-me naquele momento. Ousando parafrasear sua delicadeza, devo dizer que "nenhum leitor deveria se permitir passar por essa vida, sem se aventurar a conhecer a obra de Saramago."
Boa viagem, José Saramago!