Tudo era apenas uma brincadeira.
A gente era criança. E o faz de conta acontecia em cada gesto. Nos brinquedos que fazíamos, nos jogos diversos que inventávamos.
Numa família repleta de personagens, imitá-los foi o primeiro ato. Depois, seguiu-se a paródia dos programas de TV. Momento do Jornal Nacional, pausa para informar a programação do dia. Todos descíamos caracterizados com as roupas garimpadas nos armários dos meus pais e pronto: a festa continuava. Sim, continuava. Porque já havia começado muito antes, enquanto planejávamos a cena, definíamos os papéis e o roteiro. Tudo muito bem improvisado.
E o telejornal ficava para depois. Sempre.
O tempo correu e o jogo de criança virou paixão adolescente. Formamos uma trupe. Apaixonados por teatro e, alguns de nós, uns pelos outros.
O palco foi lugar de descobertas.
Adolescer em cena é privilégio para poucos. Na ribalta descobrimos que podíamos ser o que quiséssemos. O papel das nossas vidas poderia ter o tamanho dos nossos sonhos. E eles eram infinitos!
Após esse ato eu, minha irmã e o caçula saímos de cena e fomos buscar outros cenários.
Um dentre nós, no entanto, talvez tenha reconhecido ali que tudo podia ser espaço de criação, de realização e de tantas outras descobertas desde que o palco fosse sua vida. E daí, fez-se ator.
Continuou ainda mais artista, arteiro, inventor, escritor, escultor, desenhista. Criador. De muitas criaturas. Tantas quantas sua imaginação pudesse gestar. E ela é grandiosa. Sempre foi.
Hoje é pai de dois meninos. Dois pequenos curiosos. Entusiastas da Vida. Experimentadores. Suas melhores e maiores criações. Até o momento.
Hoje é ator. Um dos melhores que conheço. E não apenas por ser meu irmão e essa opinião estar carregada de todo o amor que sinto por ele. Mas, pelo ser humano que é. E só mesmo vivendo a vida com presença é possível atuar com verdade.
Ontem estive na estréia e encheu-me de orgulho ver a beleza do trabalho de um grupo afinado, cujas cenas pareciam um balé. Um jogo deliciosamente armado para deleite da platéia.
Em vários momentos, meu peito encheu-me de alegria e, embora tenha contido essa vontade, permaneceu comigo o desejo de dizer a todos, com grande entusiasmo, em meio aos aplausos efusivos: "Aquele cara, aquele super ator, é MEU IRMÃO!"
E para quem quiser conferir uma parte da história aqui contada e atestar a imparcialidade dessa visão, é só passar pelo Centro Cultural São Paulo e assistir Rua do Medo. Até 19 de dezembro.
Vai lá!