sexta-feira, 21 de maio de 2010

A sociedade literária e a torta de casca de batata - Mary Ann Shaffer e Annie Barrows


O quanto a palavra pode nos tornar ainda mais próximos?
Que mistérios levam os livros a criar comunidades e inspirar sonhos comuns?
Penso e sinto, desde sempre, que nos fazemos a partir de nossas histórias e de outras tantas narrativas que atravessam nossa passagem por essa estrada a qual chamamos de vida.
Já quando menina, observando o contato de meus pais com livros e jornais, nas conversas ao redor da mesa antes, durante e depois das refeições, nas histórias lidas antes de dormir... em todos os momentos, as palavras estiveram construindo sentido e dizendo-nos o que somos, ajudando-nos a responder ao que viéramos.
Sendo assim, pareceu-me natural que a literatura fosse um modo maravilhoso de criarmos sentido para nossas experiências. De gerarmos outras possibilidades de vida. De nos fazermos próximos a partir de nossa singularidade e daquilo que temos em comum.
No livro "A sociedade literária e a torta de casca de batata" são os livros que tornam-se o motivo para que, em uma ilha invadida pelos alemães durante a Guerra, alguns habitantes possam encontrar alento nas palavras de outros e dar voz aos sentimentos a partir dos personagens de outras histórias.
Narrativas atravessam o mar e, escritas em uma capa de um livro, dão início a uma deliciosa troca de cartas que, juntas, contam diferentes visões sobre as contradições entre  experiência limite do auge da violência humana e a capacidade que possuímos de sermos generosos e solidários ao sofrimento dos outros.
Quando a guerra nos rouba parte do que temos de mais precioso, é preciso encontrar sentido para estar junto. Para reconstruir. Para re-significar.
Quando a vida se apresenta como um desafio,  uma alternativa possível pode ser buscar aquilo que nos aproxima. E as palavras, ah!, elas podem generosamente nos mostrar novos caminhos.
Estejamos abertos.
Elas nos pedem passagem!
Sempre.


sexta-feira, 14 de maio de 2010

Comer, rezar e amar - Elisabeth Gilbert - Editora Objetiva

Dizem que não escolhemos os livros mas, somos escolhidos por eles.
Esse é mais um caso em que isso acontece comigo. Na verdade, dessa vez, quem o escolheu por mim foi minha mãe. Presente de aniversário.
Sucesso de vendas há algum tempo, em breve estará nas telas do cinema com Julia Roberts no papel da protagonista. O livro narra a história real de  Liz Gilbert: americana, divorciada e escritora que após uma grande crise pessoal resolve viajar o mundo e passar quatro meses exercitando com intensidade cada um dos verbos do título.
Parece bem simples. E é mesmo. Como a vida de qualquer um de nós: cheia de clichês.
Num tempo em que muitos vivem no automático, não é raro nos sentirmos vazios. Termos medo do que é novo. Daquilo que não conhecemos.
Há sempre um apego muito grande às coisas que já não fazem mais parte da nossa história, mesmo quando são elas que nos fazem mal. E, se não estivermos atentos, perdemos nossa ligação com tudo o que realmente importa.
Como Liz, penso que precisamos cuidar daquilo que comemos. Do que deixamos que seja parte do nosso corpo. Do que nos alimenta. Ou estaremos fadados há sentir o gosto amargo daquilo que não conseguimos digerir, dos sapos que engolimos e de tudo o que consumimos sem consciência. Sem decisão. E, um belo dia, acordaremos e nos daremos conta de que estamos cheios do que não nos sustenta e descobriremos que por estarmos ausentes de nós mesmos, fomos vítimas de uma mentira. Muitas vezes, uma doce mentira contada por nós mesmos.
No caso da personagem do livro essa tomada de consciência se dá em meio a um casamento fracassado. Para outros é preciso um câncer ou qualquer doença terminal. O corpo fala. E às vezes, grita. Urra.
Quando se quer o novo, é preciso abandonar o velho. Limpar o pó das mágoas. Reconhecer os movimentos que nos fazem voltar à antigos padrões. É preciso ficar sempre alerta. Atento e forte. Mantendo-se conectado com aquilo que realmente importa. Com  presença e integridade em tudo o que fazemos. Rezando. Meditando. Buscando nossa essência.
Pouco importa o caminho escolhido. Imprescindível é que ele seja feito com lucidez. Com consciência. Perseguindo arduamente o que de fato somos. O que se esconde por baixo das couraças, por traz das nossas máscaras e das fantasias que criamos para sermos "aceitos", para sobrevivermos às nossas impressões sobre o mundo que nos cerca.
Pode ser em um ashram na Índia. Ou em um lugar bem próximo e, paradoxalmente, muito mais difícil de se ir: dentro de nós mesmos.
Por fim, é preciso amar. Não da forma romântica e idealizada que nos faz consumir cafés da manhã de comerciais de margarina. Nem da forma egoísta em que se baseia a pseudo auto-estima que ajuda a vender milhões em cosméticos e auto-ajuda.
Uma vez escolhendo o que queremos trazer para dentro de nós, o que de fato nos alimenta, inevitavelmente, nos ligamos ao que realmente importa. O encontro pode nos mostrar algo que não queremos enxergar. Uma verdade dura de se ver. Mas,  se tivermos coragem e lucidez podemos aprender a aceitar, acolher, amar, compreender o que somos e quem sabe encontraremos o tão desejado equilíbrio?
Como a autora-personagem, fico feliz em saber que todos nos sentimos perdidos. É um alívio não me obrigar a ser dona de nenhuma verdade. Por que as verdades são muitas. E querer enquadrar a todos em nosso modelo de felicidade é frustração na certa. O caminho de cada um é único.
Minha busca ainda não acabou. Diferentemente de Liz Gilbert, ainda não sei onde isso vai me levar.
Mas, há uma esperança aqui dentro de que, talvez os momentos de crise possam me trazer para mais perto de mim mesma.  Pondo-me em contato com o mundo e com os outros. E, quem sabe, aproximando-me cada vez mais do que realmente pode ser a VIDA.